sexta-feira, 13 de outubro de 2017

Danos Morais: Do Extravio de Bagagem - parte III



              Quanto ao tema “extravio de bagagem”, foram analisados 73 processos no período de 2014/2017, sendo que 15 tiveram reformadas as sentenças pelas Turmas Recursais, o que equivale a 20,54% de alterações.
              Acerca deste assunto, é possível verificar maior interferência das Turmas nos valores fixados a título de reparação por danos morais, pois destas 15 reformas, 11 alteraram o quantum fixado pelo juízo a quo
              Registre-se que cabe à empresa aérea a guarda e conservação dos bens a ela entregues, sob pena de arcar com os prejuízos causados, nos termos do art. 734 do Código Civil. Impende registrar que mencionado dispositivo legal impõe ao transportador um dever de incolumidade, até o destino contratado, do passageiro e de sua bagagem. Logo, o extravio de bagagem, ainda que temporário, e a privação do consumidor de seus bens, configura falha na prestação de serviço, sendo a responsabilidade do transportador objetiva (artigo 14 do CDC), ensejando a correspondente indenização por danos morais e materiais. 
              Aliás, o extravio dos pertences do consumidor não pode ser considerado como mero dissabor, pois é dever da fornecedora zelar pelos bens a ela confiados durante a prestação do serviço. Se a empresa não oferta a segurança esperada pelos consumidores, deverá responder pelo evento em questão. Além disso, é presumida a angústia daquele que se vê privado de seus bens. A doutrina e a jurisprudência estão apoiadas na assertiva de que o prejuízo imaterial é uma decorrência natural (lógica) da própria violação do direito da personalidade ou da prática do ato ilícito. 
                Seguem os relatos dos casos que merecem destaque.
              No processo 0701454-66.2014.8.07.0016, o qual tramitou no 7º Juizado Especial Cível de Brasília, o juiz de 1º grau julgou improcedente o pedido de reparação por danos morais do requerente que teve sua bagagem extraviada quando retornou de sua viagem, sob o argumento de que a jurisprudência possui diretriz consolidada no sentido de que o extravio temporário de bagagem no trecho de volta não acarreta dano a direito de personalidade do consumidor, uma vez que ele terá acesso a todos os seus pertences em sua residência.
              Em sede de recurso inominado, o relator do acórdão 867.841 explanou que o extravio de bagagem causa ao consumidor transtornos e angústia que ultrapassam a esfera dos aborrecimentos cotidianos tanto na ida ao destino quanto na volta para casa. Ressaltou o fato de que na ida, o consumidor fica privado de seus pertences essenciais tendo inúmeros contratempos com a situação, bem como muitas das vezes tem de adquirir esses bens essenciais e fica privado de outros que planejou levar para a viagem. Já na viagem de volta, o consumidor também fica privado de seus bens essenciais, de seus objetos pessoais, de eventuais compras entre outros itens, o que lhe causa verdadeiro abalo moral e psíquico.
              Frisou ainda que não se pode deixar de reconhecer o dano moral somente pelo fato de que a parte autora retornou ao seu domicílio e, posteriormente, receberia seus pertences em casa. Isso porque a partir do momento em que o consumidor toma conhecimento do extravio até a solução do problema, com a recuperação da bagagem e sua devolução, ainda que por curto lapso temporal, torna evidente o dano direto à direito da personalidade, extrapolando a esfera dos meros aborrecimentos cotidianos, caracterizando ainda falha na prestação do serviço, especificamente quanto ao dever de transportar os pertences dos passageiros, passível de reparação. O valor fixado a título de danos morais foi de R$ 2.000,00 (dois mil reais).
       Nos processos nº 2014.01.1.089734-6 (4º Juizado Especial Cível de Brasília) e 2014.07.1.031302-0 (2º Juizado Especial Cível de Taguatinga), os juízes sentenciantes entenderam que o extravio de bagagem no trecho de volta não caracteriza dano moral, ainda que o extravio seja definitivo, ou seja, o consumidor não reaverá seus pertences.
              Nos acórdãos de nº 863.866 e 833.039, os relatores mantiveram o entendimento já destacado no acórdão nº 867.841, acrescentando que a perda de uma bagagem, de forma definitiva, com todos os utensílios pessoais que ali se encontravam, gera frustrações, angústias e dissabores que superam as vicissitudes cotidianas, sem descartar o desapossamento de bens muitas vezes revestidos de cunho sentimental, configurando o prejuízo imaterial. No 1º caso, fixou-se o valor da reparação em R$ 3.000,00 (três mil reais), e no 2º caso o quantum foi fixado em R$ 2.000,00 (dois mil reais).
              No processo nº 0715164-22.2015.8.07.0016 (2º Juizado Especial Cível de Brasília), o juiz sentenciante julgou improcedente o pedido, por ausência de comprovação de ter ocorrido defeito no serviço ou inadimplemento contratual. Frise-se que era pedido de reparação por danos morais em razão de extravio definitivo da bagagem. O acórdão de nº 911.713 reformou a sentença para fixar o valor da reparação em R$ 2.000,00 (dois mil reais).
              Nestes quatro processos supracitados, o pedido de reparação por danos morais foi julgado improcedente, com a consequente reforma pelas Turmas Recursais, para reconhecer a ocorrência de dano com a consequente obrigação de repará-lo.
              Contudo, há casos em que o valor fixado pelo juiz de 1º grau foi alterado pelas Turmas. No caso dos processos 0704469-09.2015.8.07.0016 (7º Juizado Especial Cível de Brasília) e 2013.01.1.105498-4 (2º Juizado Especial Cível de Brasília), houve extravio temporário da bagagem, com devolução em curto lapso temporal (entre 3 e 4 dias do extravio), os juízes sentenciantes fixaram, em ambos os casos, o valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), para reparação pelo dano moral sofrido.
              Em sede de recurso inominado, as Turmas Recursais proferiram os acórdãos nº 897.347 e 760.866, ambos ressaltando que houve violação aos direitos da personalidade do consumidor, porquanto experimentou transtornos e aborrecimentos indevidos que extrapolam a frustração cotidiana e que, se a parte requerida não ofertou a segurança esperada pelo consumidor, deverá responder pelos danos causados. Na fixação do valor da reparação do dano moral, em ambos os julgados se ressaltou a necessidade de se observarem os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, de modo a não aviltar o bom senso, não estimular novas transgressões, impedir o enriquecimento ilícito do ofendido e não causar a ruína do culpado, fixando o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
              No processo nº2015.09.1.004854-9 (2º Juizado Especial Cível e Criminal de Samambaia) houve extravio temporário de bagagem na viagem de ida e por um lapso temporal maior, de 23 dias, sendo localizada somente no voo de volta. Assim, considerando as circunstâncias deste caso, o juiz a quo fixou o valor da reparação em R$ 2.000,00 (dois mil reais) para cada autor (eram dois).
         A 1ª Turma Recursal analisou o fato ocorrido com os autores, asseverando que os consumidores, diante do extravio de suas bagagens, se viram obrigados a adquirir peças essenciais de vestuário e outras próprias ao inverno europeu, além de produtos de higiene pessoal. Registre-se, por oportuno, que foram 11 dias de férias em duas capitais europeias, em pleno inverno, sem que os autores pudessem dispor de qualquer item pessoal despachado no Brasil. Assim, o acórdão de nº 908.373 majorou o valor fixado pelo juiz de 1º grau, para fixar o quantum em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para cada autor.
              No processo 2014.07.1.033365-9 (2º Juizado Especial Cível de Taguatinga) houve extravio temporário da bagagem, na viagem de ida, sendo restituída após 24 horas do pouso, porém a mala estava totalmente danificada. O magistrado entendeu que a pretensão da parte autora mostrava-se dentro de parâmetro razoável e justo, tendo em vista a extensão do dano e lapso de tempo decorrido do fato, adequando-se à finalidade punitiva, pedagógica e ressarcitória que a reparação pressupõe, fixando o valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais).
            O acórdão de nº 883.949, proferido pela 1ª Turma Recursal reformou a sentença, sob o argumento de que, em observância às finalidades compensatória, punitiva, pedagógica e preventiva da condenação, bem assim às circunstâncias da causa, mostrava-se excessivo o valor arbitrado no juízo de origem, sendo mais adequado à hipótese a fixação em R$ 2.000,00 (dois mil reais).
              Nos casos do processo 0719016-54.2015.8.07.0016 (6º Juizado Especial Cível de Brasília), em que houve extravio de bagagem pelo período de 1 (um) dia, na viagem de ida, e do processo 2014.01.1.109806-4 (Juizado Especial Itinerante de Brasília) em que houve extravio temporário na viagem de volta, os magistrados sentenciantes entenderam que o valor adequado para a reparação de danos morais seria de R$ 1.000,00 (mil reais). Analisando os recursos inominados interpostos, as Turmas Recursais ressaltaram que este valor não cumpre com todas as finalidades da reparação, aviltando que a indenização não deve ser inócua, diante da capacidade patrimonial de quem paga e, muito menos, excessiva a ponto de significar a sua ruína. De igual modo, o valor não deve ser expressivo a ponto de representar enriquecimento sem causa de quem vai recebê-la, nem diminuto que a torne irrisória. Assim, o acórdão de nº 906.432 majorou o valor fixado pelo extravio de 1 (um) dia para R$ 2.000,00 (dois mil reais); e o acórdão de nº 857.076 majorou o quantum para R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais).
              Cumpre destacar, por oportuno, o processo nº 2015.09.1.002114-2 (1º Juizado Especial Cível e Criminal de Samambaia), em que houve extravio temporário da bagagem da autora, com a devolução posterior, porém sendo constatado o furto de dois itens de dentro de sua mala. Na seara da fixação do valor da reparação por danos morais devida, o sentenciante levou em consideração a gravidade do dano, o período em que a bagagem permaneceu extraviada e o porte econômico da requerida, fixando o quantum em R$ 1.000,00 (mil reais). Este valor foi mantido pela 3ª Turma Recursal, no acórdão nº 903.903, ressaltando que foram observados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
              No caso analisado no processo 2015.13.1.002900-8 (Juizado Especial Cível e Criminal do Riacho Fundo), o juiz fixou reparação em R$ 8.000,00 (oito mil reais), levando em consideração que a autora foi submetida a desgaste emocional com o extravio de mais de 30 horas de sua bagagem, e deveria embarcar no cruzeiro marítimo, acompanhada de sua mãe de 87 anos de idade, e se viu privada de seus pertences, tendo que comprar às pressas itens necessários para a viagem. Na análise do recurso inominado interposto pela empresa condenada, o relator do acórdão de nº 920.583 entendeu que este valor era excessivo, sopesados os critérios necessários para a fixação do quantum indenizatório pelos danos morais, minorando para o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), em observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
              Por fim, cumpre destacar o processo nº 2013.11.1.002882-5 (Juizado Especial Cível e Criminal do Núcleo Bandeirante), em que a parte autora percebeu que sua bagagem fora extraviada de maneira definitiva, na viagem de volta à Brasília. O juízo a quo fixou a reparação no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), sendo este mantido pela Turma Recursal, no acórdão nº 808.774. O relator destacou que a fixação do quantum a título de dano moral deve levar em conta critérios doutrinários e jurisprudenciais, tais como o efeito pedagógico e inibitório para o ofensor e a vedação ao enriquecimento sem causa do ofendido ou empobrecimento do ofensor, que deve ser proporcional à lesão à honra, à moral ou à dignidade do ofendido, às circunstâncias que envolvem o fato, às condições pessoais e econômicas dos envolvidos, e à gravidade objetiva do dano moral. Concluiu afirmando que tais critérios norteadores foram corretamente analisados na sentença, razão pela qual esta não merecia reforma quanto ao valor da reparação a título de dano moral.
              Segue tabela dos processos pesquisados:


Tabela 2 – extravio de bagagem

ACÓRDÃOS
PROCESSOS
VALOR DA INDENIZAÇÃO


NA SENTENÇA
NO ACÓRDÃO
808774
2882-5   11
R$ 8.000,00
MANTIDO
920583
2900-8   13
R$ 8.000,00
R$ 5.000,00
882763
0702111-71
R$ 7.000,00
MANTIDO
905300
0717198-67
R$ 7.000,00
MANTIDO
917314
0719975-25
R$ 7.000,00
MANTIDO
909632
0714396-96
R$ 6.000,00
MANTIDO
874506
2804-3  06
R$ 6.000,00
MANTIDO
1012284
0701063-58
R$ 6.000,00
MANTIDO
845382
22251-9  07
R$ 5.000,00
MANTIDO
888473
0703299-02
R$ 5.000,00
MANTIDO
882639
0704275-09
R$ 5.000,00
MANTIDO
921454
0719083-19
R$ 5.000,00
MANTIDO
848952
20617-9  09
R$ 5.000,00
MANTIDO
827391
102107-0
R$ 5.000,00
MANTIDO
1010815
0737502-53
R$ 5.000,00
MANTIDO
868072
0700857-97
R$ 4.000,00
MANTIDO
906391
0700874-02
R$ 4.000,00
MANTIDO
903774
0707121-96
R$ 4.000,00
MANTIDO
920184
0723240-35
R$ 4.000,00
MANTIDO
808297
3967-3  09
R$ 4.000,00
MANTIDO
813154
8118-7  07
R$ 4.000,00
MANTIDO
870918
12008-8  06
R$ 4.000,00
MANTIDO
827376
20102-0
R$ 4.000,00
MANTIDO
883949
33365-9  07
R$ 4.000,00
R$ 2.000,00
839415
89893-5
R$ 4.000,00
MANTIDO
812953
183184-6
R$ 4.000,00
MANTIDO
1006875
0713635-31
R$ 4.000,00
MANTIDO
1006888
0702448-14
R$ 4.000,00
MANTIDO
1026265
0701415-64
R$ 4.000,00
MANTIDO
991370
0722439-85
R$ 4.000,00
MANTIDO
991300
0700331-77
R$ 4.000,00
R$ 2.000,00
839311
16282-6
R$ 3.500,00
MANTIDO
764035
65413-7
R$ 3.500,00
MANTIDO
888511
0701972-22
R$ 3.000,00
MANTIDO
794779
3688-4
R$ 3.000,00
MANTIDO
847341
5326-4  04
R$ 3.000,00
MANTIDO
825727
14751-0  03
R$ 3.000,00
MANTIDO
817449
17193-7
R$ 3.000,00
MANTIDO
850201
22695-6  07
R$ 3.000,00
MANTIDO
823435
61824-7
R$ 3.000,00
MANTIDO
1002591
0700697-65
R$ 3.000,00
MANTIDO
1004148
0727148-66
R$ 3.000,00
R$ 5.000,00
1005094
0731088-39
R$ 3.000,00
R$ 6.000,00
1004437
0727895-16
R$ 3.000,00
MANTIDO
1006677
0707772-94
R$ 3.000,00
MANTIDO
1027443
0707532-71
R$ 3.000,00
MANTIDO
992624
0704924-98
R$ 3.000,00
MANTIDO
1002591
0700697-65
R$ 3.000,00
MANTIDO
908373
4854-9  09
R$ 2.000,00
R$ 5.000,00
897347
0704469-09
R$ 2.000,00
R$ 5.000,00
915560
0706260-13
R$ 2.000,00
MANTIDO
915552
0719331-82
R$ 2.000,00
MANTIDO
888561
3258-2
R$ 2.000,00
MANTIDO
908075
4433-3   07
R$ 2.000,00
MANTIDO
827113
5437-5  06
R$ 2.000,00
MANTIDO
823131
13183-0  07
R$ 2.000,00
MANTIDO
848948
24033-9  07
R$ 2.000,00
MANTIDO
760866
105498-4
R$ 2.000,00
R$ 5.000,00
833014
105688-3
R$ 2.000,00
MANTIDO
1005095
0725247-63
R$ 2.000,00
MANTIDO
1012279
0719025-79
R$ 2.000,00
MANTIDO
1015705
0700026-44
R$ 2.000,00
MANTIDO
991025
0715392-60
R$ 2.000,00
R$ 6.000,00
919471
0704206-74
R$ 1.500,00
MANTIDO
841948
104449-0
R$ 1.500,00
MANTIDO
1028176
0701151-74
R$ 1.500,00
MANTIDO
906432
0719016-54
R$ 1.000,00
R$ 2.000,00
903903
2114-2  09
R$ 1.000,00
MANTIDO
1021684
0702706-02
R$ 1.000,00
MANTIDO
857076
109806-4
R$ 1.000,00
R$ 3.500,00
867841
0701454-66
IMPROCEDENTE
R$ 2.000,00
911713
0715164-22
IMPROCEDENTE
R$ 2.000,00
863866
31302-0  07
IMPROCEDENTE
R$ 3.000,00
833039
89734-6
IMPROCEDENTE
R$ 2.000,00
PERÍODO PESQUISADO: 2014/2017

TEMA: EXTRAVIO DE BAGAGEM

73 acórdãos



15 alterações




 

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